Um salário mínimo para um estudante dormir e vai ficar tudo bem

porLuís Monteiro

21 de março 2023 - 22:56
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Reclamam as más línguas que o preço da nova oferta privada de alojamento estudantil que a CML decidiu apoiar com a presença de Carlos Moedas na inauguração é um ultraje. Nada mais errado, como não investem fundos públicos em oferta de alojamento estudantil precisam de participar nos eventos alheios.

Reclamam as más línguas que o preço da nova oferta privada de alojamento estudantil que a Câmara Municipal de Lisboa decidiu apoiar com a sua presença do Presidente Carlos Moedas na inauguração é um ultraje. Nada mais errado. Em primeiro lugar, é altamente compreensível que os responsáveis políticos participem na inauguração de novas residências privadas. Como não investem fundos públicos numa oferta de alojamento estudantil a preços acessíveis a estudantes, precisam de participar nos eventos alheios (queria escrever vergonha alheia, mas contive-me). Nada como uma bandeira da autarquia para o Senhor Presidente ir lá puxar, melhor só mesmo a fita para alguém do Governo ir lá para uma bela tesourada. Em segundo lugar, porque os preços são muito razoáveis: o quarto mais barato custa 695€ por mês, mas há preços para todos os gostos - aquele gostinho especial em derreter mais de um salário mínimo para poder dormir. Não se esqueçam é dos 800€ da caução, podem ser apanhados na curva e ninguém deseja que isso aconteça. Outra coisa ainda: a cozinha parece que tem alguns aparelhos, mas aconselham a levar outros de casa. E eu respeito essa preocupação: já imaginaram uma torradeira a trabalhar horas a fio para tantos estudantes? Sou contra a exploração!

Vi as imagens da obra. Aquilo é um trabalho bem concebido. Tudo em alumínio e vidro duplo. E como os preços são próximos dos praticados pelo alojamento local, nem se esqueceram de colocar a plantinha de plástico de 4,90€ comprada no IKEA. Por acaso admito que fiquei decepcionado, não vi na galeria de imagens a típica tabuleta“Welcome Lisbon”, com um galinho de Barcelos no canto e as margens em cortiça. Mas não se pode ter tudo. Como o objetivo era praticar preços acessíveis aos estudantes de ensino superior, é preciso saber cortar nas coisas secundárias.

Durante a pandemia, o Bloco propôs que o Estado requeresse unidades de Alojamentos Local para albergar estudantes do ensino superior, dado que não tinham quarto para dormir. Do PS ao PSD, IL e Chega, todos criticaram a proposta. Parece que alguém decidiu aproveitar, pelo menos a parte da plantinha de plástico e do ambiente AirBNB. Mas a ideia não era bem essa…

O Governo do PS anda a anunciar investimentos no setor, mas a oferta de camas para estudantes do ensino superior a preços controlados estagnou há muito tempo. As Instituições de Ensino Superior, subfinanciadas, esperam que alguém faça alguma coisa. Mas há exceções: umas investem por contra própria (e bem!), outras dão-se ao luxo de alienar património no centro das cidades. A responsabilidade social é mais uma matéria para o marketing trabalhar do que outra coisa, infelizmente. As autarquias, que reclamam sempre mais transferência de poderes do Estado Central para si, no que toca à habitação, assobiam para o lado e participam alegremente no circo da especulação imobiliária.

Este artigo é um agradecimento à Senhora Ministra do Ensino Superior e da Ciência, Dr.ª Elvira Fortunato, ao Senhor Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, Dr. Carlos Moedas, a toda a equipa executiva do Governo de maioria absoluta do Partido Socialista, liderado pelo Senhor Primeiro Ministro Dr. António Costa. O esforço que tem sido feito para resolver o problema do alojamento estudantil é de uma grandeza sem precedentes. E quando as coisas são bem feitas, só nos fica bem aplaudir. Parabéns a todos os envolvidos.

Acham caro? Então despeço-me com uma resposta de um liberal que li há dias numa rede social a propósito da inflação nos supermercados: não compres. Vai ficar tudo bem.

Luís Monteiro
Sobre o/a autor(a)

Luís Monteiro

Museólogo. Investigador no Centro de Estudos Transdisciplinares “Cultura, Espaço e Memória”, Universidade do Porto
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