Onda de greves no Reino Unido

16 de março 2023 - 15:17

O dia em que foi apresentado um Orçamento do Estado que beneficia os rendimentos mais altos, penaliza os mais baixos e congela os investimentos nos serviços públicos foi também o momento mais alto até agora da maior onda de greves numa década.

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Funcionários públicos britânicos em greve e manifestação esta quarta-feira. Foto de ANDY RAIN/EPA/Lusa.

Esta quarta-feira, dia em que o governo apresentou o orçamento do Estado, foi o ponto alto da mais recente onda de greves do Reino Unido. Vários setores, porém, optaram por repetir as paralisações nesta quinta-feira e o calendário de luta tem várias outras datas marcadas ainda este mês. Desde o último trimestre do ano passado, e com particular intensidade em fevereiro deste ano, que se assiste à que tem sido considerada a maior onda de greves da última década, sobretudo por questões salariais dado o aumento significativo da inflação.

Desta feita, no Serviço Nacional de Saúde britânico, os médicos em especialização estiveram em greve de 13 a 15 de março. O pessoal de ambulâncias tem nova greve marcada para dia 20, depois de já o terem feito em dezembro e fevereiro. E a marcação desta nova greve já forçou o Governo conservador, que até aqui se recusara, a entrar em negociações. Os enfermeiros também tinham feito greves em dezembro, janeiro e fevereiro. Continuam a ter greves marcadas mas a BBC avança com a possibilidade do Royal College of Nursing chegar a acordo com o Governo. E o mesmo se diz de outros dos setores da saúde, depois de o Governo lhes ter feito nova proposta negocial. Por exemplo, os fisioterapeutas tinham feito greve a 26 de janeiro e 9 de fevereiro, mas suspenderam a greve marcada para dia 22 porque o Governo aceitou entrar em negociações.

No setor ferroviário, os trabalhadores do metro de Londres estiveram em greve dia 15. Dia 16, 18 e 30 e 1 de abril os trabalhadores de 18 empresas ferroviárias farão greve.

Já os funcionários públicos também se juntaram à greve desta quarta-feira. E os examinadores de testes de condução têm este mês marcados dez dias de greve, seguindo a greve de dia 1 de fevereiro.

Os professores ingleses fizeram greve nestes dois últimos dias num processo que é igualmente a continuação das greves de fevereiro. Os do País de Gales suspenderam a greve por terem entrado em negociações e os da Escócia desmarcaram-na por terem chegado a acordo com o Governo.

Os trabalhadores das universidades escolheram os dias 16 e 17 e de 20 a 22 para a sua greve.

Os trabalhadores dos correios também tinham marcado uma greve para 16 e 17 mas a empresa contestou em tribunal esta convocatória e ela acabou por ser retirada. Só na segunda metade de 2022, estes trabalhadores fizeram 18 dias de greve numa disputa forte com a administração.

A greve chegou ainda à empresa pública de rádio e televisão. O sindicato dos jornalistas marcou uma greve de 24 horas, que terminou às onze horas desta quinta-feira, contra a fusão de vários programas de rádio locais.

Um orçamento para os mais ricos

Entretanto, o orçamento apresentado pelo governo de Rishi Sunak não surpreendeu nas suas escolhas políticas. As medidas são apresentadas pelo Guardian como sendo “boas notícias para quem tem mais rendimentos”.

No plano fiscal, o congelamento de escalões até 2028 fará com que muitos passem a pagar impostos, quando antes estavam isentos, ou passem a pagar mais. Aumentos salariais abaixo da inflação poderão resultar assim numa dupla perda: face ao poder de compra e no aumento de impostos.

Nas pensões, está previsto um “enorme aumento” das que estão isentas de impostos, alargando assim os benefícios fiscais aos 1% mais ricos, uma das medidas mais polémicas. Por outro lado, dada a pressão popular, rendimento mínimo e pensões aumentarão em 10,1%, o salário mínimo 9,7%, continuarão os apoios aos lares com rendimentos mais baixos por causa de inflação e os apoios ao pagamento da energia devido à crise. Os apoios aos cuidados infantis também crescerão, anuncia-se.

O Instituto de Estudos Fiscais contabilizou que até um milhão de pessoas que tem subsídios por incapacidade podem perder 350 libras por mês devido a uma mudança na forma de avaliar a incapacidade para o trabalho.

E do lado dos serviços públicos também não há boas notícias. Torsten Bell, dirigente da Resolution Foundation defende que o Orçamento “simplesmente ignora” os serviços públicos, deixando-os perante “planos de despesa implausivelmente apertados”. A análise ao Orçamento feita por esta organização não governamental conclui que o documento não contém medidas que possam reverter o declínio das condições de vida e que “a economia da Grã-Bretanha continua estagnada”, com os trabalhadores a “ficar mais pobres e a pagar mais impostos, mas vendo os serviços públicos serem cortados”.

Os trabalhistas reagiram igualmente de forma crítica à apresentação do Orçamento. A ministra-sombra para as Finanças, Rachel Reeves, promete reverter a borla fiscal aos mais ricos. Para ela, “numa altura em que as famílias em todo o país enfrentam faturas crescentes, custos mais altos e salários congelados, esta oferta dourada é a prioridade errada na hora errada para as pessoas erradas”.