Carta aberta pelo trabalho digno contra as pressões patronais

14 de março 2023 - 22:13

Os patrões têm feito campanha contra as novas leis laborais. Juristas, investigadores e sindicalistas respondem que as confederações patronais não têm “poder de veto" nem a sua discordância é fundamento de inconstitucionalidade das medidas aprovadas na Assembleia da República.

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Trabalho. Foto de Paulete Matos.
Trabalho. Foto de Paulete Matos.

53 juristas, investigadores e dirigentes sindicais respondem em carta aberta às confederações patronais a propósito da sua recente campanha contra as novas leis laborais.

A missiva é assinada por especialistas em direito do trabalho como Leal Amado, Teresa Coelho Moreira, uma das coordenadoras do Livro Verde sobre o Futuro do Trabalho, António Monteiro Fernandes, Joana Nunes Vicente e Alexandra Leitão, dirigentes da UGT como Sérgio Monte, sete membros da comissão executiva da CGTP e Rogério Nogueira, o coordenador da Comissão de Trabalhadores da Autoeuropa.

Para além disso, assinam ainda José Soeiro, deputado do Bloco atualmente com o mandato suspenso, e Miguel Matos, deputado do PS, e figuras como Manuel Carvalho da Silva, Henrique de Sousa ou Paulo Pedroso.

A carta aberta que para além da divulgação pública foi entregue na Presidência da República critica as confederações patronais por se estarem a insurgir “crescentemente contra a reforma laboral aprovada pelo Parlamento, em tomadas de posição pública e em reuniões com titulares de cargos políticos”, alegando “a suposta inconstitucionalidade de diversas normas da Agenda e, sobretudo, na qual se contesta vivamente o procedimento legislativo adotado, em virtude de ter havido normas aprovadas pelo parlamento que não teriam sido previamente discutidas em sede de concertação social”.

Notando que “a oposição das confederações patronais à reforma laboral concentra-se significativamente, e não por acaso, em matérias em que esta reforma das leis laborais representa progressos do ponto de vista da justiça laboral”, sublinha-se que se tenta “instrumentalizar indevidamente a concertação social para os seus propósitos e colocá-la em confronto com o poder legislativo.

Assim, os signatários, que fazem questão de afirmar “que não desmerecem, antes valorizam, a concertação social e o seu papel, enquanto instância privilegiada de diálogo social tripartido e de negociação e enquanto importante órgão de consulta do Governo, em tudo o que diz respeito a matérias laborais”, desmontam o argumento patronal como baseando-se na ideia “perigosa” de que “o fórum apropriado para elaborar a legislação do trabalho, no nosso país, não seria o parlamento, mas sim a concertação social”.

Para eles, isso “é um equívoco” já que “o Estado de direito democrático assenta em pilares outros e sólidos, tais como o da soberania e reserva parlamentar na formulação das leis e o da responsabilidade da maioria parlamentar e governamental pela condução da política do país, inclusive no que às questões laborais diz respeito”. Não é assim aceitável “qualquer narrativa que pretenda confundir os poderes de órgãos politicamente legitimados pelo voto popular (como é o caso, por excelência, da Assembleia da República) com os poderes de órgãos sociais setoriais, que representam grupos de interesse, os quais, por muito estimáveis que sejam, não têm qualquer legitimidade para assumir poderes próprios dos órgãos de soberania previstos na Constituição”.

Manifestam-se, portanto contra as “tentações corporativas” de “confundir concertação com legislação ou confundir um órgão consultivo sobre políticas públicas e de diálogo social tripartido com um órgão legislativo”. E consideram que o processo seguido “são as regras de funcionamento do sistema democrático a funcionar, sem perversões”. A perversão “assaz perigosa” a que se referem é a ideia de que “as confederações patronais disporiam de uma espécie de poder de veto em matéria de legislação laboral”. Ou de que a sua discordância “constituiria por si só fundamento de inconstitucionalidade”. Para eles,o que se passou foi afinal apenas “a democracia a funcionar”.