FCT reduz drasticamente bolsas de Sociologia e altera ordem proposta pelo júri

23 de janeiro 2014 - 1:08

A Associação Portuguesa de Sociologia denuncia que “a FCT reduziu drasticamente a atribuição de bolsas de doutoramento e pós-doutoramento” nas ciências sociais e, nomeadamente, na área de Sociologia. O Júri de Avaliação das candidaturas de Sociologia acusa ainda a FCT de ter alterado a ordem dos candidatos propostos pelo júri. A coordenadora do júri, Beatriz Padilla, e João Teixeira Lopes demitem-se do painel de avaliação de Sociologia da FCT.

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Protesto dos bolseiros - Foto da página da ABIC no facebook
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O Júri de avaliação das candidaturas a bolsas da FCT da área de Sociologia, que foi convidado em setembro de 2013, denuncia (ler comunicado na íntegra) em carta ao Presidente da Fundação para a Ciência e Tecnologia, Miguel Seabra, o “incumprimento do compromisso assumido em relação ao financiamento de pelo menos 10% das candidaturas” e a “alteração do resultado da avaliação” feita por este júri, que para tal foi nomeado. O júri solicita esclarecimentos a Miguel Seabra e “a reposição da avaliação” que efetuaram e aprovaram.

Os membros do júri referem que a ordem de candidaturas por eles elaborada “não corresponde à ordenação dos candidatos divulgada pela FCT”, sublinhando que “foram introduzidas alterações irregulares à ordenação discutida e consensualizada durante a reunião final do júri, a qual foi feita em presença de duas técnicas da FCT”.

Os membros do júri salientam ainda que “o Coordenador não pôde assumir uma das suas responsabilidades”, “visto que não foi chamado a participar em eventuais dúvidas ou problemas e é alheio a posteriores decisões à reunião final do Júri”.

Os membros do júri esclarecem ainda que foram informados que a alteração da ordem “terá sido motivada por um controlo de qualidade posterior” e questionam: “por que motivo não foi informado o Coordenador do Painel e por que motivo não foi dada ao júri a possibilidade de decisão final sobre a avaliação dos candidatos, como previsto no regulamento”.

Cortes ainda maiores nas ciências sociais

A Associação Portuguesa de Sociologia (APS), em carta a Miguel Seabra (que pode ler na íntegra aqui) critica os cortes drásticos nas bolsas, salientando que os cortes são ainda maiores nas ciências sociais, alertando para a “discriminação incompreensível e inaceitável” destas áreas e pedindo esclarecimentos ao presidente da FCT.

Os cortes no número de bolsas na área de Sociologia são particularmente gravosos, verificando-se que “para as Bolsas de Doutoramento (BD), a variação face a 2012 é de menos 40%, enquanto que para as bolsas de pós-doutoramento o decréscimo é de 65%”.

Salientando que parece estar a assistir-se a “uma orientação sistemática de desmantelamento do sistema de I&D Nacional”, a APS denuncia que ao atribuir apenas bolsas a 10% do total das candidaturas se está a fazer “um claro desaproveitamento das competências e do potencial criativo e inovador de muitos candidatos e das instituições de investigação científica que os apoiam”.

A APS sublinha ainda que os cortes são particularmente drásticos e graves nas ciências sociais em que “essa percentagem fica entre 5 e 7% e, no caso concreto da Sociologia, pouco ultrapassa os 6%”. E referindo que “a FCT assegurou aos membros dos painéis de avaliação que não seriam atribuídas menos de 10% de bolsas face ao total de candidaturas”, a APS realça que “é legítimo depreender que existiram critérios institucionais, alheios aos avaliadores, que funcionaram no sentido da forte penalização para as ciências sociais”, o que segundo a associação configura “uma discriminação incompreensível e inaceitável”.

Beatriz Padilla e João Teixeira Lopes demitem-se

Segundo a Lusa, a coordenadora do júri, Beatriz Padilla, apresentou à FCT o seu pedido de demissão face ao procedimento da FCT. E, tal como Teixeira Lopes, não participará no recurso do concurso.

Num post no blogue “Inflexão” com o título “A FCT vicia o 'mérito'”, João Teixeira Lopes anuncia a sua demissão de membro do painel de avaliação de Sociologia da FCT no seguimento das posições assumidas pelo júri de avaliação e pela APS.

Teixeira Lopes refere que as anomalias havidas no concurso das bolsas de Sociologia “configuram um atentado grave à transparência e mesmo ao princípio de reconhecimento do mérito em igualdade de circunstâncias”.

Referindo que entende “que a política científica tenha referenciais e orientações que se alteram com o quadro do poder”, o sociólogo considera que não pode “ser cúmplice de processos de atropelo à transparência, ainda que legitimados por um qualquer fanatismo ideológico que perpassa o discurso da FCT” e afirma: “enquanto a atual direção da FCT se mantiver em funções, recuso-me a desempenhar o papel de avaliador, por aquela não me merecer as condições mínimas de confiança”.