"Prova de amamentação é ultraje às mulheres"

21 de abril 2015 - 22:04

O Bloco de Esquerda pediu explicações ao Governo sobre a "prova de amamentação" ilegal que está a ser exigida às enfermeiras em dois hospitais públicos do Porto e no Centro Hospitalar no Algarve.

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Em requerimento entregue na Assembleia da República, Helena Pinto e José Soeiro defendem a erradicação urgente das práticas denunciadas na última semana por enfermeiras dos hospitais de Santo António e São João, no Porto. O Bloco de Esquerda quer mais informações sobre o recurso a estas provas de amamentação noutros hospitais do SNS e denuncia a sua ilegalidade.

"Uma sociedade decente não pode permitir que esta indignidade aconteça", diz o requerimento do Bloco, que cita o testemunho de uma enfermeira que foi obrigada a espremer as suas mamas para que lhes fosse validada a condição de lactante. Para o Bloco de Esquerda, "a dispensa para amamentação e/ou aleitação é um direito consagrado no Código do Trabalho e o seu exercício não está dependente do beneplácito da entidade empregadora". E a partir do primeiro ano da criança, o direito à dispensa para amamentação é feito através da entrega de uma declaração do médico assistente a confirmar que a requerente se encontra a amamentar. "É esta declaração que faz prova da amamentação", lembra o Bloco, e não quaisquer "provas" prestadas no local de trabalho.

Esta terça-feira, num requerimento assinado por Cecília Honório e Helena Pinto, o Bloco denuncia que a prática das provas de amamentação se estendeu ao Centro Hospitalar do Algarve, onde a falta de enfermeiros está a impedir o cumprimento dos horários de alimentação e até mesmo o gozo das licenças parentais. As deputadas dizem que não é aceitável que numa altura em que o parlamento debate as soluções para a natalidade em Portugal, se registem situações destas nos hospitais públicos. As denúncias partiram do Sindicato de Enfermeiros Portugueses numa reunião entre os grupos parlamentares e entidades ligadas à área de saúde no Algarve e para o Bloco trata-se de "práticas próprias do século XIX e que atropelam direitos fundamentais".

Administrador do hospital que acusa enfermeiras é dirigente do CDS

António Sollari Allegro, o administrador do Hospital de Santo António que defendeu a prática de pôr as enfermeiras a fazer estas provas de amamentação, pertence à Comissão Política do CDS. Sollari Allegro reconheceu à Rádio Renascença que "é evidente que [a situação das enfermeiras] é desagradável, mas também não é muito honesto estar a aproveitar de uma facilidade da lei e estar três e quatro anos [em horário reduzido]".

O dirigente centrista acusa as enfermeiras que denunciaram a situação humilhante de terem sido elas próprias a escolher o método de espremer as mamas, quando podiam ter optado pelo uso da bomba extratora ou o teste de prolactina. Perante o escândalo provocado por esta prática ilegal, Sollari Allegro não recua e diz mesmo que os testes vão continuar, com recurso obrigatório ao teste de prolactina. Curiosamente, o outro hospital que adotou a mesma prática excluiu este teste por considerar que não é fiável, revela o jornal Público. Assim, no hospital de São João, para além dos outros dois métodos, é proposto às profissionais levarem os seus filhos para o hospital e darem-lhes ali de mamar, "em ambiente recatado".

Para o Bloco de Esquerda, "esta é uma situação absolutamente incompatível com a dignidade das mulheres, que tem que ser erradicada e não pode haver qualquer complacência para com estas práticas nem para com as instituições que as implementam".

Também a Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego reagiu às notícias sobre as provas de amamentação, referindo que basta o atestado médico para comprovar a amamentação para efeitos de dispensa. "A legislação laboral não prevê qualquer outra comunicação de trabalhadora lactante ao empregador, de modo a comprovar o seu estado", garantiu a presidente da CITE, Joana Gíria.

Por seu lado, o ministro da Saúde colocou-se à margem do assunto, garantindo à agência Lusa que "não demos quaisquer orientações nesse domínio e não tenho conhecimento de qual é a metodologia".