“PSD e CDS trocaram um favor entre si: a proteção de Durão Barroso e de Paulo Portas”

08 de outubro 2014 - 15:04

PS, PCP e Bloco votam contra relatório da comissão de inquérito sobre equipamentos militares, considerando que se trata de um documento de "lavandaria", com "buracos negros" para "proteger Durão e Portas". João Semedo declara: “PSD e CDS entenderam-se, trocaram um favor entre si, mutuamente vantajoso: a proteção de Durão Barroso e de Paulo Portas, a proteção dos seus”.

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Foto de dExTer, Flickr

Os deputados José Magalhães (PS), Jorge Machado (PCP) e João Semedo (BE) apresentaram nesta quarta-feira em conferência o texto com o título "Relatório viciado, Inquérito inacabado", alternativo ao da relatora da comissão parlamentar de inquérito aos programas relativos à aquisição de equipamentos militares, a deputada do PSD Mónica Ferro. Os três deputados de PS, PCP e BE salientam que o texto da deputada do PSD e relatora "não tem condições de seriedade, de coerência e de consistência para poder ser aprovado".

Segundo a Lusa, o deputado José Magalhães do PS afirmou: "É um sinal de que não devemos desistir da descoberta da verdade e deixar reescrever a História. Esta proposta de relatório é viciada e o inquérito ficará escandalosamente inacabado, por vontade da maioria. A Assembleia não deve ser a lavandaria da República, não deve servir para branquear factos que todos podem documentar".

O deputado Jorge Machado do PCP realçou: "Tivemos uma comissão de inquérito apressada. Este relatório não tem sequer a seriedade e credibilidade necessárias para ser aprovado. Elencámos um conjunto de matérias dos buracos negros que ficaram por esclarecer. Serviu como tentativa pífia de ilibar as responsabilidades políticas de PSD e CDS".

João Semedo do BE sublinhou: "Foi uma comissão que se destinou, pela força da maioria PSD/CDS-PP, a proteger Durão Barroso e Paulo Portas. Desde o início se percebeu que era esse o objetivo de PSD e CDS. Quando votaram esta comissão, fizeram-no por má-fé porque desde o início tentaram esvaziar o inquérito e torná-la sem qualquer interesse político para a história da democracia portuguesa".

Na comissão, o coordenador do Bloco de Esquerda apresentou a seguinte declaração de voto, que publicamos na íntegra:

“PSD e CDS trocaram um favor entre si, mutuamente vantajoso: a proteção de Durão Barroso e de Paulo Portas”, declaração de voto de João Semedo

PSD e CDS aceitaram esta comissão de inquérito de má-fé. Aprovaram na para depois sabotar o seu trabalho, esvaziar o inquérito, impedir o esclarecimento. PSD e CDS entenderam-se, trocaram um favor entre si, mutuamente vantajoso: a proteção de Durão Barroso e de Paulo Portas, a proteção dos seus.

A deputada Mónica Ferro fez um relatório de conveniência que replica a verdade oficial imposta por muitos silêncios e cumplicidades, ao longo dos últimos anos, dispensando mesmo alguns elementos novos obtidos pela comissão. As conclusões da relatora do PSD e CDS são tendenciosas, parciais e mesmo mentirosas.

Exigia-se a esta comissão respostas concretas e definitivas sobre quatro perguntas simples relativas aos contratos dos submarinos:

- os alemães foram favorecidos ou os interesses do estado foram defendidos?

- o grupo espírito santo foi favorecido ou as condições de financiamento protegeram as finanças públicas?

- corrupção condenada na Alemanha, houve corrupção em Portugal e quem beneficiou dela?

- qual o grau de responsabilidade dos governantes que conduziram estes processos?

Na opinião da relatora, estas perguntas – há muito impostas por uma opinião pública cada vez menos condescendente - são meras insinuações.

Por isso respondo a cada uma dessas perguntas:

- há cláusulas no contrato dos submarinos que favorecem o consórcio fabricante e desprotegem o estado

- a fase final da negociação da operação de financiamento da compra dos submarinos favoreceu o consórcio financeiro que incluía o BES, permitindo lhe alterar com vantagem algumas condições contratuais, tratamento de exceção de que não beneficiaram os outros candidatos.

- a pergunta não obteve resposta porque, na hora certa, sempre surgiu o biombo judicial.

- a acreditar no dr. Durão Barroso, a responsabilidade é toda do dr Paulo Portas; a acreditar nos factos, a responsabilidade é dos dois;

- há cláusulas no contrato dos submarinos que favorecem o consórcio fabricante e desprotegem o estado
- a fase final da negociação da operação de financiamento da compra dos submarinos favoreceu o consórcio financeiro que incluía o BES
- a acreditar no dr. Durão Barroso, a responsabilidade é toda do dr Paulo Portas; a acreditar nos factos, a responsabilidade é dos dois

A deputada Mónica Ferro fez um relatório de conveniência que replica a verdade oficial imposta por muitos silêncios e cumplicidades, ao longo dos últimos anos, dispensando mesmo alguns elementos novos obtidos pela comissão.

As conclusões da relatora do PSD e CDS são tendenciosas, parciais e mesmo mentirosas.

Tendenciosas porque só aceita, admite e reconhece factos e situações que sustentam a versão que quer ver consagrada.

Parciais porque omite, esconde e desvaloriza informação e opinião que contraria a narrativa que quer impor.

Mentirosas porque não é verdade que “nenhuma pergunta ficou por fazer” e muito menos que “não se retirou qualquer indício de cometimento de ilegalidades”.

Mesmo o único consenso a que a comissão podia formular não aparece sequer nas conclusões: as contrapartidas foram um pântano, um embuste, uma falácia, para citar apenas alguns ex governantes, cuja semântica criativa se libertou quando eles se libertaram do governo.

A relatora consegue o milagre de ver outra explicação para o insucesso das contrapartidas: a culpa é da CPC nas suas várias existências, conclusão que surge embrulhada em sete outras conclusões que são na íntegra – calcule se lá – copy paste de textos da DILP, da DGAE e outros.

É assim, um relatório viciado e um inquérito inacabado.

Permanecem dúvidas por esclarecer, contradições por resolver, ficam muitas perguntas sem respostas, são mais que muitas as omissões.

Podia ter sido diferente se PSD e CDS tivessem outra cultura de debate, outra matriz democrática, outra relação com a verdade e, também, outro respeito pelo Parlamento e pelas suas regras.

A maioria pode impor-se pelos seus votos mas não pode dispensar-se de respeitar as regras. A primeira regra da democracia é exatamente respeitar as regras. Se as regras não respeitam a democracia, a democracia não as deve respeitar. Se as regras não nos respeitam, então, não devemos respeitar essas regras.

PSD e CDS só tiveram duas preocupações: acabar com o inquérito o mais depressa possível e que poucos dessem pela sua existência.

O inquérito conclui-se sem que alguma documentação seja conhecida e outra nem sequer se localizou por se desconhecer o seu paradeiro. As audições sucederam se a um ritmo que impedia, antes, a sua preparação, e depois, a sua sistematização e tratamento. Algumas contradições ficaram por esclarecer porque PSD e CDS recusaram mais audições. Importantes informações conhecidas nos últimos dias ficaram por tratar e aprofundar.

E como se de uma homenagem do vício à virtude se tratasse até audições se realizaram durante as férias parlamentares.

A pressa foi tanta que a relatora nem à comissão apresentou o relatório.

Tudo isto com o beneplácito do sr. Presidente que se fez passar por árbitro e se esqueceu todo o tempo que estava aqui eleito pelo Parlamento e não pela maioria, que estava aqui com a missão de representar Parlamento e não a maioria a que pertence. Não foi um bom presidente nem não pouco um bom árbitro.

Tal presidente, tal comissão.

Espero e confio que a comissão que aí vem – o inquérito ao BES – esclareça o que PSD e CDS não deixaram agora esclarecer. Mas, sobretudo, o que espero e confio é que a próxima comissão permita contrariar a imagem de subserviência atrelada que esta comissão deixou aos olhos dos cidadãos.

Declaração de Voto do deputado João Semedo sobre o Relatório final dos trabalhos da Comissão Parlamentar de Inquérito aos Programas Relativos à Aquisição de Equipamentos Militares (8 de outubro de 2014)