BES: "Governo está a enganar os portugueses", afirma ex conselheiro de Durão Barroso

06 de agosto 2014 - 13:32

O economista liberal Paul De Grauwe defende que "o Governo está a enganar os portugueses" quando garante que a operação de resgate do BES não terá custos para os contribuintes. Num artigo publicado na Forbes, o analista económico Raoul Ruparel afirma que essa garantia “é, na melhor das hipóteses, irreal e, na pior, deliberadamente enganosa”. Jornal Expresso alerta que “há um contágio à economia que ainda está por acontecer”.

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Foto de Paulete Matos.

"Sei que o Governo está a recapitalizar a parte boa do BES num montante de 4,9 mil milhões de euros. Isto significa que o Governo português está a assumir uma dívida”, mesmo que esta venha, eventualmente, a ser depois compensada mais à frente, avançou o professor de Economia na Universidade de Leuven, na Bélgica, em declarações ao Dinheiro Vivo.

“Seja com um empréstimo do FMI e da UE, ou não, é indiferente", acrescentou.

O especialista em economia monetária internacional, que conta no seu currículo com passagens pelo FMI, Banco Central Europeu e Reserva Federal Norte Americana, entre outros, frisou que, "ao fazer isto, o Governo põe os contribuintes em risco, como acontece sempre que emite mais dívida".

Paul De Grauwe, que já foi conselheiro de Durão Barroso, referiu ainda que "pode acontecer que quando o Governo vender o BES, faça lucro" e que “isso serão boas notícias para os contribuintes”, alertando, contudo, que “hoje, ninguém sabe se isso irá acontecer”.

“Também pode acontecer o contrário, isto é, o Governo pode incorrer em perdas", avançou.

Assim, "a conclusão é que [o executivo PSD/CDS-PP] está a colocar em risco os contribuintes. Se o Governo diz que isto não é verdade, está a enganar os portugueses".

Garantia é, na melhor das hipóteses, irreal e, na pior, deliberadamente enganosa”

Num artigo intitulado “The Good, The Bad And The Ugly Of Banco Espirito Santo's Resolution Plan”, e publicado na Forbes, o analista económico Raoul Ruparel afirma que “a garantia, por parte do Banco de Portugal, de que 'a operação [de resgate do BES] não envolve quaisquer custos para o erário público' é, na melhor das hipóteses, irreal e, na pior, deliberadamente enganosa”.

“O Estado está claramente a oferecer um empréstimo que vai continuar a implicar riscos até ser restituído e que implicará, no mínimo, desviar fundos de outros fins”, frisa Ruparel.

O analista económico lembra ainda que “o plano de reembolso do empréstimo está longe de ser claro” e que ainda não há quaisquer certezas sobre “quem estará disposto a capitalizar na totalidade o novo banco”.

"De qualquer forma, a ideia de que o empréstimo ou injeção temporária vai ser facilmente reembolsado” - que tem vindo a ser avançada em todos os resgates bancários - “às vezes provou ser verdadeira, mas muitas vezes falsa”, afirma Ruparel.

“Se o empréstimo não for reembolsado até ao fim do ano, o Estado terá de emitir obrigações extra num total de 4 mil milhões para cumprir a sua meta de ter uma almofada financeira de 10 mil milhões de euros no início de 2015”, acrescenta.

Raoul Ruparel adianta ainda que os credores seniores foram protegidos, o que não está em conformidade com a Diretiva sobre Recuperação e Resolução dos Bancos que entra em vigor em janeiro de 2015.

No artigo é ainda feita referência ao facto de a Comissão Europeia (CE) e o Banco de Portugal (BdP) terem diferentes versões sobre o futuro do novo banco e o reembolso do empréstimo. Enquanto, segundo avança Ruparel, o BdP espera que o empréstimo seja refinanciado pelo setor privado, com o “banco bom” a tornar-se numa “instituição permanente”, a CE conta que o novo banco seja temporário e venha a ser vendido, no seu todo ou em parcelas, sendo o montante amealhado a garantir o reembolso do empréstimo. Neste contexto de incerteza, não são claras as consequências da operação para o sistema bancário e para os cerca de 10.000 trabalhadores do BES.

Quanto ao “banco mau”, o analista económico escreve que o seu futuro ainda é incerto e que, se for necessário qualquer financiamento adicional, não é conhecida a sua origem.

“Há um contágio à economia que ainda está por acontecer”

O Expresso Diário de 5 de agosto alerta que, “mesmo que tudo corra bem no Novo Banco (onde ainda há algumas indefinições nos ativos, nomeadamente quanto à carteira de imobiliário), há um contágio à economia que ainda está por acontecer”.

“No GES, a dimensão das empresas que deverão fechar portas (que não são todas, mas muitas) é tão grande que haverá centenas ou milhares de desempregados. Depois, muitos fornecedores que já estão hoje com recebimentos em atraso ficarão mesmo a “arder” com dinheiro e perderão estes seus clientes”, avança o jornal.

Já no respeita especificamente ao BES, “o impacto na economia portuguesa vem do dinheiro que “desapareceu” de investidores, acionistas e credores (incluindo algumas fortunas familiares que estavam na Suíça e que eventualmente retornariam), mas também da redução do crédito que deverá acontecer, para redimensionar o banco”.

“Tendo em conta que o BES é o principal banco português das pequenas e médias empresas, são estas que perdem um parceiro habitual. Finalmente, as ações do BES eram garantia de vários empréstimos de outras empresas, que portanto também ficam em condições difíceis. O caso da Portugal Telecom é o mais evidente entre os detentores de papel comercial e a própria desvalorização das ações da PT faz ricochete para o BES e para empresas como a Ongoing”, escreve ainda o Expresso Diário.