Quem são os novos patrões de Paulo Portas

06 de abril 2016 - 10:37

O ex-líder do CDS foi indicado pela empresa Pinto Basto Gest para vice-presidente da Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa. Nos últimos anos, esta empresa ligada aos transportes marítimos tem apostado na presença em Angola. E é herdeira de uma das mais velhas fortunas familiares portuguesas, que atravessou os séculos e as benesses de vários regimes.

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Bruno Bobone (presidente da CCIP e administrador do Pinto Basto) Miguel Horta e Costa, João Ferreira de Lima e Pedro Rocha e Melo acompanharam Paulo Portas na tomada de posse. Foto Miguel A. Lopes/Lusa

Após o chumbo do governo PSD/CDS no parlamento, Paulo Portas anunciou a saída da vida política e deixou no ar a vontade de se dedicar às empresas. O mistério desfez-se este mês, com o anúncio do ex-vice primeiro ministro como vice-presidente da Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa (CCIP), liderada por Bruno Bobone, o presidente do Conselho de Administração do Grupo Pinto Basto.

Paulo Portas anunciou a entrada no novo cargo como “uma forma muito útil de continuar a ajudar a internacionalização das empresas e o sector exportador, que são os pilares do nosso crescimento”. E fez questão de sublinhar que se trata de um cargo não-remunerado com o pelouro da internacionalização.

No organigrama dos corpos sociais da CCIP, Paulo Portas aparece em representação da Pinto Basto Gest, uma empresa do grupo Pinto Basto que se dedica à gestão de transportes e cargas. O grupo Pinto Basto é o maior grupo português na área dos transitários e a presença em Angola tem sido consolidada nos últimos anos. É também acionista da empresa financeira Advisories Services Capital (ASK), com ramos em Portugal, Brasil e Angola, onde é presidida pelo ex-ministro da Indústria angolano Manuel Duque.

Entre os fundadores da ASK estão alguns dos novos colegas de Paulo Portas na CCIP, a começar pelo presidente Bruno Bobone, que ainda é administrador da ASK Portugal. Nuno Fernandes Thomaz, o centrista que fez parte do governo Durão/Portas com a pasta dos Assuntos do Mar, é agora vogal da CCIP indicado pela Caixa Geral de Depósitos. Fernandes Thomaz vendeu a participação na ASK e deixou de ser CEO da empresa em 2011, quando foi nomeado pelo governo PSD/CDS para administrar a CGD.

O principal elogio público na hora da despedida da política portuguesa veio precisamente de Angola, com o jornal do regime a destacar o ”empenho pessoal" do ex-governante para que em diferentes ocasiões os laços entre os dois países fossem "particularmente estreitados". O editorial do Jornal de Angola destacava o aviso deixado por Paulo Portas contra a “tendência para a judicialização” das relações entre Portugal e Angola, pouco depois de ser conhecida a investigação jornalística e judicial aos alegados subornos recebidos pelo procurador que arquivou investigações sobre o atual vice-presidente angolano Manuel Vicente.

O poder dos Pinto Basto na oligarquia portuguesa

A família Pinto Basto destaca-se no comércio português desde o século XVIII, com a criação de uma casa comercial no Porto, dedicada à importação e exportação. Em 1818 consegue o contrato dos tabacos e reais saboarias do reino e o seu poder estende-se à compra de propriedades rurais. As ramificações da família constituem uma rede que se espalha pelo país, em torno do patriarca José Ferreira Pinto Basto.

O livro “Os Donos de Portugal” (ed. Afrontamento, 2010) resume o percurso da família na história económica e política portuguesa nos últimos séculos e o próprio site da empresa destaca uma citação do Barão de Forrester, em 1853, sobre as primeiras décadas deste império familiar: “Os Ferreira Pinto Basto são uma família muito antiga e muito próspera que crescem e multiplicam-se conforme os mais rigorosos princípios patriarcais, que se unem no pacto filial e fraternal, e que formam de maneira linda e perfeita uma comunidade entre eles”.

Para além dos tabacos e sabões, os Pinto Basto fundaram a Vista Alegre, estavam presentes nos negócios das minas, do açúcar, da indústria e caminhos de ferro, foram deputados e senadores, atravessando todas as disputas políticas do século XIX português com os seus negócios a prosperarem graças aos monopólios e benesses do Estado, com destaque para o controlo da navegação e infraestruturas numa altura em que a economia operava uma viragem para as colónias africanas.

No processo de privatizações de 1834/43 – que envolveu milhares de propriedades nacionalizadas à Igreja, família real e ordens militares após a guerra civil – José Ferreira Pinto Basto, uma das personalidades políticas que conduziram o processo, torna-se o quinto maior arrematador nos leilões, multiplicando assim sua fortuna na década seguinte a fundar a Vista Alegre.

Esses nove anos de privatizações foram um absoluto fiasco orçamental, ao aceitarem como pagamento diversos títulos desvalorizados pelo seu valor nominal, ou seja, vendendo com um desconto que chegou aos 90%. Quem tinha mais títulos saiu mais beneficiado e foi desta forma que menos de 200 pessoas se apropriaram de cerca de 75% do total do valor arrematado. “Desde o Minho ao Algarve, possuem um conjunto de pousadas em propriedades suas, com uma distância entre elas de um dia de caminho”, prosseguia o barão de Forrester acerca da prosperidade dos Pinto Basto.

Os ramos da família Pinto Basto ligados à Vista Alegre e dos transportes marítimos conseguiram chegar e atravessar toda a I República e a ditadura de Salazar, mantendo o poder de ditar as políticas para os respetivos setores, com os administradores a participarem no 1º Congresso da União Nacional. A ligação da família Pinto Basto à família Mello faz-se através do casamento da sobrinha de Manuel de Mello, Maria da Conceição, com António d’Orey Pinto Basto.

Dividida por mais de 60 herdeiros, a fortuna Pinto Basto desaparece das listas dos maiores milionários no início da década de 1990. No início deste século, arrancou com um processo de internacionalização na área do transporte marítimo, com Angola como ponto de partida, seguindo-se Espanha e Hong Kong.