“Ou acabamos com a precariedade, ou Portugal será uma gigantesca mafia laboral

23 de março 2016 - 13:36

Segundo José Soeiro, "se a precariedade foi uma escolha, combatê-la é uma questão de dignidade”. A deputada Isabel Pires alertou para a necessidade de acabar com a “perversão laboral” das empresas de trabalho temporário e Joana Mortágua referiu-se à “utilização abusiva” e até “ilegal” dos Contratos Emprego-Inserção.

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Durante o debate temático parlamentar sobre precariedade laboral, Isabel Pires destacou que “quando debatemos precariedade e formas de lutar contra ela, temos que nos lembrar que debatemos a vida de pessoas: no seu local de trabalho, nas suas relações no local de trabalho, na sua organização de vida”.

“Neste âmbito, há uma questão que é particularmente importante de ser discutida: o papel das empresas de trabalho temporário”, que, enquanto “intermediários entre uma empresa que pede um serviço e um trabalhador que presta esse serviço”, servem “apenas um propósito: criar relações laborais precárias”, avançou.

“Criada esta perversão laboral, lucram alguns e quem trabalha perde sempre”, salientou a deputada, defendendo que as ETT “devem ser travadas com urgência”.

“Enquanto não se acabar com o abuso que representam estas empresas, teremos ainda um caminho longo a percorrer até que possamos dizer que somos uma sociedade avançada, que não explora os seus trabalhadores para acumulação de lucros de alguns”, acrescentou Isabel Pires.

“Administrações públicas transformam-se em offshore de direitos laborais"

Referindo-se à “utilização abusiva” e até “ilegal” dos Contratos Emprego-Inserção, Joana Mortágua defendeu que “não é possível fazer um combate sério à precariedade quando as administrações públicas se transformam num offshore de direitos laborais".

A deputada bloquista referiu os exemplos dos trabalhadores do contact center do Centro Distrital de Lisboa, que assinaram um contrato de 12 meses sem quaisquer férias, trabalham agora 40 horas semanas, substituindo trabalhadores que foram despedidos, e dos trabalhadores da delegação de Portalegre do Instituto de Segurança Social.

Joana Mortágua questionou o Governo sobre se “vai reconhecer que há necessidade de substituir esta forma brutal de abuso laboral e de exploração por contratos com direitos”.

"Ou acabamos com a precariedade, ou Portugal será uma gigantesca mafia laboral"

José Soeiro defendeu que “a precariedade não foi um acaso ou uma fatalidade”. “Foi uma estratégia concreta para reduzir os custos do trabalho, para aumentar a exploração no trabalho, para aproveitar o desespero e a falta de oportunidades para impor uma selva”, frisou o deputado.

Segundo José Soeiro, a precariedade é uma “chantagem”, uma “mordaça”, uma “violência” e um “roubo”.

"O relógio está a contar. Se a precariedade foi uma escolha, combatê-la é uma questão de dignidade”, defendeu o dirigente do Bloco, sublinhando que é preciso "voltar a olhar para o trabalho como um direito e não como um favor ou um privilégio".

José Soeiro fez referência a algumas das propostas concretas apresentadas pelo Bloco para combater a precariedade:

- mãos pesadas contra os falsos recibos verdes – se o crime compensa, é preciso punir exemplarmente as entidades empregadoras que recorrem a ele; 

- mudar o Código do Trabalho para facilitar a presunção do contrato de trabalho, para limitar a utilização dos contratos a prazo, o abuso do trabalho temporário e o recurso ao outsourcing;

- aprofundar a lei contra a precariedade que resultou da iniciativa legislativa cidadã dos trabalhadores precários e que já regularizou 1800 falsos recibos verdes, alargando esse mecanismo às falsas bolsas, aos falsos estágios e ao falso voluntariado;

- concretizar um novo regime de contribuições para os trabalhadores a recibos verdes para que passem a descontar efetivamente em função do que recebem em cada momento e também garantir que estes trabalhadores têm proteção no desemprego, na doença e no acompanhamento dos filhos;

- fazer dos estágios um trampolim para um emprego efetivo e não um alçapão para a precariedade, obrigando as empresas a integrar pelo menos 1 trabalhador como efetivo por cada 2 estagiários que tenham;

- alocar mais meios para o combate à precariedade, nomeadamente contratando mais duzentos inspetores para a Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT);

- pôr a ACT a fiscalizar o Estado – os estágios do IEFP os abusos dos Contratos de Emprego-Inserção;

- dar o exemplo no Estado, acabando com as formas de trabalho forçado;

- refundar a solidariedade e o trabalho como direito coletivo – reintroduzir o “princípio do tratamento mais favorável ao trabalhador” e o princípio da vigência da convenção coletiva até à sua substituição por outra.